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ARTIGOS

08/03/2025

"Justiça Privada"

Imagem/Arquivo Pessoal
Detalhes Notícia

Não comento publicamente casos de processo sob a minha atribuição de promotor de justiça. Meus textos publicados, artigos, em regra, versam sobre literatura, filosofia, teologia ou outros temas universais. Excepcionalmente, vejo-me no dever profissional de fazer esta exposição. Estou como promotor de justiça há décadas, desde 1995. A partir de 2014 passei a atuar como promotor do júri em Araçatuba, tendo trabalhado em centenas de casos de processos de homicídio. O Tribunal do Júri, em conformidade com a Constituição da República e com o Código de Processo Penal, julga crimes dolosos contra a vida, sendo o mais comum e o mais grave deles, o homicídio. O formato do Tribunal do Júri no Brasil é o seguinte: sete jurados compõem o conselho de sentença que julgam por maioria um (a) acusado (a) em votação secreta. O voto (decisão) de cada jurado é sigiloso para a preservação deste, sendo o julgamento feito por maioria. O jurado não fundamenta a decisão de condenação ou de absolvição (o juiz de direito sim, para os demais crimes), bastando responder a quesitos formulados pelo juiz de direito na sala secreta, com “sim” ou “não”, por meio de cédulas que são depositadas numa urna. Os jurados não podem conversar entre si sobre o caso em julgamento, diferentemente do que ocorre no júri dos EUA. Feita essa introdução acadêmica e contextual, passo a expor o fato. Na semana próxima passada trabalhei em um processo criminal complexo e triste, até pela motivação dele: a vítima foi morta porque teria abusado sexualmente de um adolescente, parente dos acusados. Ao término desse julgamento, em razão da condenação e da prisão imediata dos réus (há decisão recente do Supremo Tribunal Federal que assim determina), familiares deles causaram tumulto no interior do salão do júri do Fórum, com a prática de intimidações e impropérios direcionados a mim e aos jurados. O juiz presidente da sessão requisitou reforço policial, os desajustados foram retirados do local e os jurados saíram escoltados pela polícia militar. Esse não foi o primeiro caso de tumulto dessa natureza no Tribunal do Júri em Araçatuba. Compreendo o sentimento do familiar de qualquer condenado, como também, e mais, entendo a dor da família da vítima que foi assassinada; em especial, neste caso específico, pela ação de várias pessoas, usando na execução do crime de crueldade singular. Tudo na vida tem dois lados ... A desgraça nesse contexto é recíproca, pois sofrem ambas as famílias, tanto a da vítima, como a dos acusados. A diferença é que essa vítima não volta mais ao convívio dos seus entes queridos. Os acusados desse caso foram julgados com base na lei, tiveram excelente defesa (plenitude) e foram condenados, conforme o entendimento da maioria dos jurados. Observo, por outro lado, que a vítima do homicídio não teve a mesma oportunidade (direito) que tiveram os acusados, de se defender num processo legal sobre o suposto abuso sexual que lhe atribuíram: foi ela “condenada” e executada sumariamente à pena capital (morte). O bem maior do ser humano lhe foi tirado: a vida. O meu “papel”, assim, enquanto promotor de justiça (e não de condenação), neste caso concreto, como em outras centenas de casos em que já atuei, foi o de fazer a acusação de forma justa e respeitosa, tanto que pedi aos jurados para reconhecerem uma circunstância que diminuiu a pena dos acusados (relevante valor moral), à luz da motivação do crime. Se o meu entendimento nesse caso fosse pela absolvição dos acusados, por insuficiência de provas, faria tal pedido por ser um dever moral, como já o fiz em dezenas ou talvez em centenas de outros casos no Tribunal do Júri. Mas, sob a minha ótica, a prova foi suficiente para a condenação desses acusados e ela ocorreu, por decisão dos jurados. Por tudo isso, precisamos aprender e compreender que: quem comete crime, seja qual for, violando a lei, deve ser punido! A motivação de um crime, por si, não exclui a responsabilidade penal do seu agente. Estamos sob a égide de um Estado de Direito, onde a lei deve ser aplicada e respeitada. Caso contrário, a anarquia estaria instalada e o lema seria de “cada um por si e Deus ou o Diabo para todos”. Fazer justiça com as próprias mãos é ato de barbárie, que nos remete a períodos da história de horror, como o vivenciado na idade média. Um erro (crime) não pode justificar a prática de outro, ou seja, linchando-se o estuprador, perde-se a razão, incorrendo-se em outro delito (homicídio). Para evitar isso, portanto, que existe o Estado, representado pela Polícia Militar, Polícia Civil, Polícia Federal, pelo Ministério Público e pelo Poder Judiciário. Para isso que existem instituições públicas e privadas para a defesa de acusados de crimes, como a Defensoria Pública e a Ordem dos Advogados do Brasil. Precisamos viver em sociedade de forma civilizada. Lembro que o “crime organizado” costuma se valer de “julgamentos” dessa natureza, executando sumariamente pessoas e agindo como uma “justiça paralela”. Isso não pode ser aceito ou normalizado. O cidadão de bem precisa se conscientizar de que “justiça privada”, ou seja, fazer justiça com as próprias mãos, gera injustiça e mais violência. Registro, por fim, que já fui ameaçado muitas vezes (inclusive com disparos de arma de fogo no prédio da promotoria de justiça em Penápolis), como vários outros promotores (a) de justiça, juízes (a) de direito e policiais o foram. Quanto a mim, asseguro que o trabalho ético, impessoal e firme continuará. Espera-se que as pessoas respeitem o trabalho dos agentes públicos e evoluam, moral e espiritualmente, para a formação de uma sociedade melhor, mais justa e com menos violência.

(*) Adelmo Pinho é promotor de Justiça do Tribunal do Júri em Araçatuba/SP. Este articulista escreve periodicamente para o jornal DIÁRIO DE PENÁPOLIS. E-mail: adelmopinho@terra.com.br

Adelmo Pinho (*)



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